O diabo é o pai do Rock


É triste, mas pouca gente entende a ironia de Raul. Já faz parte do imaginário popular pensar que rockeiro é drogado, baderneiro e satanista, mesmo que você não conheça um único rockeiro que seja tudo isso.  Minha mãe é a primeira a arregalar os olhos quando digo que vou para um show de rock. Ela imagina todos aqueles homens cabeludos vestidos de preto, tocando uma música barulhenta, enquanto todos os outros cabeludos balançam a cabeça. Provavelmente pensa que vou ser esmagada ou pisoteada durante uma roda punk, quando, na realidade, eu permaneço praticamente intocada dentro de um círculo invisível de proteção. Chega a ser irritante ouvir os caras falando o tempo todo: “ó a menina aí”, “cuidado com a menina”, como se eu fosse de vidro, mas só essa preocupação já é uma amostra de como os rockeiros são gente finíssima.

As rodas punks, ao contrário do que se pensa, não são uma manifestação gratuita de violência. São muito mais uma catarse coletiva onde as pessoas liberam toda aquela energia que está sendo absorvida pela música. A vibração é tão grande que é preciso extravasar, libertar os demônios (vê? libertar, não invocar). É claro que nessa brincadeira todo mundo acaba levando pelo menos uma cotovelada ou um “pisão” no pé, mas se alguém cai, tem sempre uma mão vinda não-se-sabe-de-onde pra te levantar.

Um dia desses, quando eu voltava de um show, o taxista começou a falar sobre como eu devia tomar cuidado com esses lugares, de como os rockeiros só vivem chapados e não querem nada com a vida. O irônico é que ele estava ouvindo um DVD de Whitney Houston, aquela da música “I will always love youuuuuu” do filme do guarda costas (deve ser o único sucesso dela), que curiosamente tinha acabado de morrer por overdose de cocaína. Fiquei de cara com o preconceito, ou com o conceito que ele achava que tinha sobre algo que ele provavelmente jamais havia experimentado (o rock, não as drogas).

Mas a verdade é que arte e drogas sempre andaram juntas.  As substâncias se diversificaram, algumas só mudaram de nome, mas grande parte da produção criativa da humanidade nem mesmo existiria se não fossem por elas. Eu, particularmente, agradeço ao LSD por músicas como “Shine on you crazy diamond”, do Pink Floyd, e por tantas outras do Bob Dylan, Rolling Stones e até mesmo dos próprios Beatles.

Quanto ao satanismo, convenhamos, é uma crença como outra qualquer. Assim como existe o rock cristão, também existe o rock satânico, que, aliás, atende por nomes bastante sugestivos, como Black e Death Metal, para que você não seja pego de surpresa.  Entenda, não se trata de uma regra, é apenas a beleza da democracia e da liberdade de expressão¹, que permite que as pessoas escrevam músicas sobre qualquer coisa, inclusive sobre bundinhas e garrafas. Não falo isso com desdém, acredite, o sexo é um elemento recorrente na história da música e da arte em geral, justamente por ser uma linguagem universal. Digamos apenas que alguns compositores são, hm... mais refinados do que outros.

Se o diabo é o pai do rock, então ele é também o pai do funk, do axé, do pop e da bossa nova. Mas Raul, apesar de incompreendido, já havia alertado: “Existem dois diabos, só que um parou na pista/Um deles é o do toque, o outro é aquele do exorcista”. O diabo do toque é o diabo do conhecimento, da lucidez, da resistência e da liberdade do pensamento. Einstein provavelmente curtia esse toque, o Freud também. Mas se por acaso você venha a ter com o "outro" demônio, aí meu amigo, a culpa não é do rock não!


¹ DEIXA EU FALAR, FILHA DA PUTA!

2 comentários:

Mirna Garcia disse...

Natália! Adorei ler esse texto! Não conhecia seu blog, espero que se torne um bom canto de leitura pra mim!

www.ummolhar.blogspot.com

Hecatombe disse...

Natália, achei seu comentário em outro blog, do seu perfil busquei seus blogs (todos) e adorei lê-los (todos). rs.
Quanto ao rock, é isso aí girl... Satânicos é o cac... a gente gosta é de música boa... heheh.
Ganhou mais uma fã, pelas palavras e pelo bom gosto... ;)

http://sempreumpoucomais.blogspot.com